terça-feira, 30 de maio de 2006

Entrevista J.C. RAMOS FILHO

O IDEALIZADOR DA CAMISINHA POÉTICA




O poeta João da Cruz Ramos Filho nasceu em Paço do Lumiar, cidade maranhense com pouco menos de 100 mil habitantes, no dia 18 de julho de 1953. Depois de morar em São Luís (MA), Fortaleza (CE) e Brasília (DF), João, que hoje é conhecido como J. C. Ramos Filho, adotou Itajaí (SC) como lar desde 1981. Foi lá que J.C. lançou seu primeiro livro de poemas e, mais ainda: ganhou notoriedade ao materializar sua idéia de utilizar embalagens de camisinha para transmitir suas mensagens. Esse homem das camisinhas poéticas é o entrevistado do mês do Zona Sul. (Roberto Homem)

ZONA SUL – Sua infância foi no interior do Maranhão?

JC RAMOS – Minha infância já foi em São Luís. Meus pais foram morar na capital quando eu tinha três ou quatro anos. Quando meu pai, João da Cruz Ramos, morava em Paço do Lumiar, trabalhava como lavrador. Pouco depois que nasci, ele foi nomeado funcionário público federal no IAPC (Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Comerciários), que seria hoje o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). Praticamente fomos obrigados a ir morar mais perto do seu trabalho, devido às dificuldades de transporte. Assim mudamos para São Luís.

ZONA SUL – A poesia começou em São Luís? Como você descobriu que tinha o dom de escrever?
JC RAMOS – Sim, começou em São Luís. Eu sempre fui uma pessoa sonhadora. Passei a maior parte do tempo sonhando. A poesia veio dos sonhos. Eu tinha belas namoradas imaginárias. Até hoje lembro daquele que, talvez, tenha sido meu primeiro poema. Chama-se Amor. É uma poesia pela qual sinto um carinho imenso. Fiz para a minha primeira namorada...

ZONA SUL – Namorada real ou imaginária?
JC RAMOS – Já real. Pelo menos real na minha cabeça, porque ela existia. Mas ela não sabia que era minha namorada. O poema é assim:
“Amor, sentimento próprio dos corações / Alma gêmea da amizade / Amor, paixão de minhas paixões / Pivô da felicidade / Amor, sombra do passado / Lindo sonho do presente / Empenho do apaixonado / Dor que o coração sente / Amor é que faz do fraco, forte / E do feio, formoso / Amor é o único sentimento / Doce, amargo e maravilhoso”

ZONA SUL – E essa musa real, mas namorada imaginária, chegou a ler esse poema? O namoro saiu da ficção para a realidade?
JC RAMOS – Depois que o tempo passou, acredito que ela tenha tomado conhecimento desse poema. Aliás, ele está no meu primeiro livro, Água de Cacimba, lançado em 1998, pela Editora Papalivro, de Florianópolis. Mas o namoro ficou mesmo só na ficção.

ZONA SUL – O que você fazia com essas primeiras produções, com os seus primeiros poemas? Você era solitário? A poesia era servia como companhia?
JC RAMOS – Eu ia guardando. O meu sonho era um dia publicar um livro. E fui guardando, guardando... Mesmo eu não sendo solitário, a poesia era uma companhia, era algo que estava sempre presente no meu dia-a-dia. Onde eu estava, nascia poesia. Se eu passava, no ônibus, e via uma criança comendo um pão sujo, ou coisa parecida, nascia uma poesia.

ZONA SUL – Nascia apenas na imaginação ou você chegava a transferir a idéia para o papel?
JC RAMOS – Nascia na imaginação e eu transferia para o papel, quando chegava em casa.

ZONA SUL – Você cria a partir da inspiração ou do trabalho?
JC RAMOS – Crio mais a partir da inspiração. Continuo sendo um adolescente sonhador. Daí é que sempre vem a poesia.

ZONA SUL – Como foi sua vida em São Luís?
JC RAMOS – Fiz até meados do segundo grau em São Luís, quando, a convite de irmãos que moravam em Fortaleza, fui procurar trabalho na capital cearense. Estudei, fiz alguns cursinhos, mas, nos dois anos que morei lá, não consegui emprego. Voltei para São Luís, para prosseguir os estudos, quando surgiu a oportunidade de gerenciar um escritório de representações comerciais em Brasília. Lá terminei o segundo grau, no Ceab (Centro Educacional Ave Branca), em Taguatinga.

ZONA SUL – Como foi morar em Brasília? Até então sua poesia continuava inédita?
JC RAMOS – Foi muito bom. A serviço desse escritório eu viajava sempre para São Paulo e Rio de Janeiro. Trabalha com utilidades domésticas, calendários... Mas minha poesia não era tão inédita assim, já que em São Luís eu tinha um quadro em um programa na Rádio Educativa do Maranhão chamado Música, amor e fantasia. Eu tinha meia hora para divulgar minhas poesias. Música instrumental servia como pano de fundo para a palavra. Em Brasília cheguei a divulgar meu trabalho em jornais e também em emissoras de rádio.

ZONA SUL – Você chegou a se preparar de alguma forma, a estudar para fazer poemas? Você chegou a participar de concursos literários?
JC RAMOS – Não estudei. As pessoas começaram a dizer que o que eu escrevia era poesia, e eu acreditei. Também não participei de concursos literários. Eu não tinha muito tempo para isso. Ficava mais naquela de aproveitar as oportunidades que iam surgindo. Eu não corria atrás. Escrever para mim era uma terapia, algo que fazia parte da minha vida e que eu tinha que extravasar de alguma forma. Mas isso vinha de uma maneira muito tranqüila, espontânea e gostosa. A poesia na minha vida sempre foi assim: algo que torna o meu dia mais cor de rosa, agradável, flexível...

ZONA SUL – De Brasília você foi para onde?
JC RAMOS – Fui aprovado em um concurso para o Tribunal Regional do Trabalho de Santa Catarina e, em novembro de 1981, fui para Itajaí. Eu tinha uma irmã que morava por lá, já tinha visitado e gostado da cidade. Lá encontrei um terreno muito fértil para o meu trabalho. Itajaí me adotou, da mesma forma que eu também adotei a cidade. Foi lá que comecei a dar passos mais audaciosos e mais rápidos no sentido de lançar um livro. Comecei a falar para as pessoas, a mostrar meus poemas. Também passei a ter maior facilidade para divulgá-los nos jornais e emissoras de rádio. Entrei no curso de Estudos Sociais e passei a trabalhar também na Universidade do Vale do Itajaí (Univale), que na época chamava-se Fundação Educacional do Vale do Itajaí (Fepevi). Eu saía das aulas e ía para os bares tomar uma cervejinha. Nessas ocasiões geralmente eu declamava para os colegas. Isso foi começando a chamar a atenção das pessoas que passaram a me cobrar a publicação de um livro.

ZONA SUL – E como você reagia a esses apelos?
JC RAMOS – Eu respondia que esse era o meu grande sonho, mas que para ele se tornar realidade era preciso apoio, já que eu não tinha condição financeira para bancar esse sonho. Comecei a amadurecer a idéia e passei a lutar por esse meu grande sonho. As pessoas começaram a prometer me apoiar. Mas, o tempo passou e só comecei a ser mais contundente nessa busca em 1997. Arrumei um dinheirinho e fiz um boneco do meu trabalho. Foi então que as pessoas compreenderam que não era brincadeira. Muitos dos que disseram que iam me apoiar viram que a coisa estava muito perto de se tornar realidade. Mas o momento era outro, e estes, que tinham se comprometido em ajudar em outra época, não podiam naquele momento. A vida é assim. Na ocasião eu já estava fazendo Direito na universidade. Procurei o apoio do reitor, que me proporcionou uma pequena quantia. Consegui apoio do município de Itajaí, através do porto municipal. Mas, para o valor do livro, as quantias de apoio eram, de certo modo, irrisórias, apesar de muito significantes. Claro que o dinheiro me interessava naquele momento, mas o mais importante ainda era envolver as pessoas no meu sonho.

ZONA SUL – A decisão de apoiar significava que aquela instituição estava acreditando em você...
JC RAMOS – Exatamente. Eu envolvi todo mundo no meu sonho. No meu trabalho envolvi juízes, colegas, todo mundo. Eu pensava 24 horas em realizar esse grande sonho. Afinal de contas, eu não era mais um adolescente, não podia fracassar. Era minha vida. Entrei de cabeça naquele sonho. Quanto mais gente apostava em mim, maior a responsabilidade. A minha esposa, Eliana Verônica Paulo, também me deu um apoio muito grande e começou a ir em busca de mais gente. Ela trabalha nos Correios, e o pessoal de lá começou a se envolver no trabalho também. Até que o sonho se concretizou, e de uma maneira grandiosa. O lançamento do livro Água de Cacimba, em 1998, foi uma coisa fantástica, modéstia à parte. Foi muita coragem a minha lançar em um auditório com a capacidade de 700 pessoas, sem nenhum outro evento paralelo. Era apenas o meu trabalho como estrela. Além do mais eu não era um filho de Itajaí efetivamente.

ZONA SUL – Existe algum tipo de discriminação em Itajaí contra os nordestinos?
JC RAMOS – Acho que o Sul, de uma maneira geral, tem. Muito embora, em momento algum, eu tenha me sentido discriminado.

ZONA SUL – Mas, de qualquer forma, tinha mais essa barreira...
JC RAMOS – Sem dúvida. Além de ser nordestino, também tem o fato de eu ser negro. Infelizmente ainda existe isso. Você não pode esquecer esse lado. Talvez pela minha simplicidade, pelo meu jeito, consegui quebrar todas as barreiras. Você pode ser o que for, cheio de estigmas, etc, mas se você acredita em você mesmo, a coisa fica muito mais fácil. Se eu não acreditar no meu trabalho, na minha condição de ser gente, de ser um cidadão brasileiro, acreditar nos meus direitos, eu me autodiscrimino.

ZONA SUL – Isso, você cria uma barreira antecipadamente...
JC RAMOS – Uma barreira para mim mesmo. Então meu pior inimigo serão meus próprios conceitos... Ou preconceitos.

ZONA SUL – Quantos poemas têm o livro? Como foi selecionar entre os poemas de uma vida toda?
JC RAMOS – O Água de Cacimba deve ter uns 100 poemas. Foi uma dificuldade muito grande escolhê-los, você nem imagina. Tinha um universo já, quando selecionei, de uns 300 poemas. E eu gostava de todos. Pensei em levar meus poemas para a professora Rosa de Lourdes, ela é doutora em Português e em Literatura, escreveu vários livros. Queria que ela dissesse se aquilo realmente era poesia, se valeria a pena eu publicar. Mas imediatamente dei um stop. Se ela dissesse para mim que eu tinha nascido para a poesia, que eu era um novo Carlos Drumonnd de Andrade ou um novo Gonçalves Dias, eu ficaria tão feliz, contente e eufórico que talvez estragasse a minha vida. Principalmente se eu lançasse o livro pensando nisso e as pessoas não dessem a mínima para ele. Por outro lado, se ela dissesse pra mim que a poesia era para ser jogada no lixo e que eu devia procurar outro tipo de ocupação, eu jamais lançaria meu livro. Então fiz questão de ter a coragem de me expor e levar ao público. Se eu tivesse escolher algum algoz que este algoz seria o público. Convidei Rosa de Lourdes, e ela aceitou, para fazer a apresentação do livro.

ZONA SUL – Colocar a responsabilidade em uma pessoa só seria até injusto com essa própria pessoa.
JC RAMOS – E até comigo mesmo. Graças a Deus eu tive a iluminação de não ter partido para esse lado. Então comecei a fazer a seleção. Tinha poesia que eu pensava: “pode até ser que ninguém goste, mas se eu não colocar...”. Vamos citar o exemplo da poesia Amor, que eu declamei há pouco tempo. Se eu não a tivesse colocado, ficaria muito triste. Não ficaria bem comigo mesmo. Arrisquei: independente de alguém gostar ou não, decidi colocá-la. Foi assim com muitas outras.

ZONA SUL – Algumas poesias ganham vida própria...
JC RAMOS – Sem dúvida. Que me desculpe minha atual amada, mas vou citar um exemplo. Acho que todos nós nos apaixonamos um dia pelas primeiras professoras. Eu sentava na primeira fila, apesar de não era o primeiro aluno da classe. Era o primeiro geograficamente, sentava ali para olhar para a professora. Ela ensinava Português e, acho, Educação Artística. Eu sabia que ela era noiva. Eu olhava muito para ela. Então comecei a fazer uma poesia para ela, na cabeça. Mas ela nunca tinha dado oportunidade para nada. De repente, depois que eu voltei de uma viagem, a professora declamou baixinho para mim: “Oh! que saudades que tenho / Da aurora da minha vida / Da minha infância querida...”, citando Casimiro de Abreu. Eu perguntei se ela gostava de poesia. A professora confirmou. Eu disse que escrevia algumas bobagens. Ela pediu para eu levar pelo menos uma para ela ler. Cheguei em casa e fiz a seguinte poesia, que tem o título de Olhos nos teus olhos. “Se me olhasse nos olhos / Eu não precisava falar / Pois para sentir que eu te amo / Basta fitar-me no olhar / Mas sempre que eu te olho/ Teus olhos fogem dos meus / Como se meus olhos fossem chamas / E queimassem os olhos teus / Mas um dia eu pousarei / O meu olhar no teu olhar / E os teus olhos sorridentes / Aos meus irão dar mais calor / E não verás chamas de fogo / Apenas brilho de amor”

ZONA SUL – Qual era sua idade nessa época?
JC RAMOS – Eu devia ter uns 17, 18 anos. Ela, uns 25, 26. Peguei um papel de carta da minha irmã e escrevi a poesia. Coloquei em um envelope e entreguei para a professora. Disse que essa era uma das poesias que eu tinha feito e que gostaria que ela desse uma olhada. Ela pegou, leu e não me olhou mais, nem falou mais comigo. Fiquei com medo até de ser reprovado. Eram duas disciplinas que eu corria o risco de perder. Mas tive a coragem de chegar para ela e pedir desculpas. “Estou notando que você nunca mais me cumprimentou nem falou mais comigo. Será que foi por causa daquela besteira que escrevi lá no papel?”

ONA SUL – Com medo da reprovação você renegou a própria poesia...
JC RAMOS – Claro, sem dúvida. Ela disse que não. Que tinha adorado, apenas tinha esquecido de comentar. Mas aquela professora nunca mais foi a mesma comigo, depois que percebeu que minha musa era ela.

ZONA SUL – Voltemos ao primeiro livro...
JC RAMOS – Certo, o relações públicas da universidade ofereceu o hall do teatro para o lançamento, um espaço com capacidade para cerca de 40 pessoas. Eu respondi que meu sonho era outro: queria lançar no anfiteatro. A princípio ele não queria aceitar, alegando que o espaço era grande demais. Insisti até ele concordar. Depois a universidade me ofereceu 500 convites, mas eu retruquei que precisava de três mil. Minha idéia era mandar convites para pessoas que eu conhecia em todo o Brasil. Certamente nem todas iriam, mas mandariam fluidos positivos para mim. A universidade topou me dar os três mil e eu mandei imprimir, por conta própria, outros dois mil. Comecei a distribuir nos semáforos com a minha esposa (que na época era minha noiva). Familiares, amigos e colegas de aula também ajudaram na divulgação. Também mandei vários convites pelos Correios.

ZONA SUL – Seu conterrâneo José Sarney também teve participação nesse primeiro livro...
JC RAMOS – Levei o boneco do livro para São Luís em busca de alguém para fazer uma apresentação. Por ser membro da Academia Brasileira de Letras e já conhecer alguma coisa do meu trabalho através do quadro que eu tinha no programa de rádio, resolvi procurar o senador José Sarney. O pior que poderia acontecer era ele dizer não. Fui. Sarney pediu para eu deixar a mostra do trabalho, mas não prometeu nada antecipadamente. Até por ele ser uma pessoa pública e membro da ABL, ele não colocaria seu nome em uma publicação sobre a qual não tivesse um conhecimento mais apurado. Quando voltei, a secretária me entregou a apresentação escrita por Sarney de próprio punho. Só não me recebeu porque estava atendendo a imprensa naquele momento. Outro fato interessante do Água de Cacimba é que ele foi o primeiro livro divulgado em embalagens de camisinha. Foi a estréia desse tipo de marketing.

ZONA SUL – Nesse não tinha poesia nas embalagens de camisinha...
JC RAMOS – Não. Era só a divulgação. O nome do livro e algumas frases, alguns trechinhos que do livro. Distribuí 720 preservativos, na época, além dos 5 mil convites. Também mandei para o Jô Soares algumas dessas camisinhas. Não mandei o livro porque ele não estava pronto ainda. Enviei as camisinhas e a capa do livro. Ele divulgou em seu programa, que na época era transmitido pelo SBT.

ZONA SUL – Como surgiu a idéia de usar camisinhas para divulgar seu livro?
JC RAMOS – Infelizmente Itajaí tem uma grande incidência de número de soros-positivos. Houve até uma pecha de que Itajaí seria a capital nacional da Aids. O próprio ex-ministro da Saúde, José Serra, falou isso baseado em estatísticas. Eu estava me preparando para lançar o livro quando vi essa notícia. Comecei a pensar em como eu poderia ajudar a reverter esse quadro. Foi quando surgiu a idéia. Antes de contar para qualquer pessoa, pesquisei na Internet para ver se tinha algo parecido. Descobri que não.

ZONA SUL – O que você fez para viabilizar a idéia?
JC RAMOS - Como eu já usava o preservativo da Olla, redigi uma carta e apresentei a idéia para a empresa. Na correspondência eu contava que não só usava, mas recomendava o preservativo deles, o único com o qual eu tinha me adaptado após começar a usar preservativos. Sugeri eles lançarem no mercado a camisinha poética. A empresa respondeu classificando a idéia de sensacional, mas que não poderia patrocinar meu livro porque estavam ampliando a fábrica. A camisinha poética poderia interessar a eles, mas no futuro, seria analisada posteriormente. O bom é que a resposta da Indústria Nacional de Látex Ltda, a Inal, fabricante da Olla, vinha com o nome e a assinatura de um diretor, José Gonçalves Araújo.

ZONA SUL – Esse diretor passou a ser o seu contato na Inal...
JC RAMOS – Sim. Telefonei para a Inal. Foi uma dificuldade imensa falar com o diretor de uma empresa que naquela época já era a maior, no seu ramo de atividade, da América Latina. Mas ele atendeu: “o que o senhor quer, seu João, o que tínhamos de falar para o senhor já mandamos pela carta”. Falei do meu desejo de ajudar Itajaí a reduzir os índices de incidência de Aids, de que eu queria divulgar meu livro através de pequenos fragmentos dos poemas colocados nas camisinhas e que tinha certeza que aquela iniciativa despertaria muita atenção. José Gonçalves perguntou como eu pensava em viabilizar essa idéia. Expliquei que eu pensava em afixar etiquetas com as informações que pretendia divulgar em cima de um dos lados da embalagem de papelão da camisinha. Ele topou e prometeu mandar 720 preservativos. Eu pulei de alegria.

ZONA SUL – Qual foi a reação das pessoas a esse, digamos assim, marketing inusitado?
JC RAMOS - Quando eu comecei a entregar os preservativos às pessoas, isso em 1997, 1998, elas torciam o nariz para o meu trabalho. Teve até um juiz amigo que perguntou como eu tinha coragem de misturar minha poesia com preservativo. Respondi que se ele, com formação de juiz, tinha se impactado, imagine as outras pessoas. Ele compreendeu que minha intenção era mesmo a de criar um impacto sobre o meu trabalho.

ZONA SUL – E, paralelo a isso, quebrar um pouco do tabu pelo uso da camisinha.
JC RAMOS – Sem dúvida alguma, e eu consegui.

ZONA SUL – Você chegou a ser entrevistado pelo Jô Soares?
JC RAMOS – Infelizmente não. Ele divulgou meu trabalho em duas ocasiões: em 1998, no lançamento, e no ano seguinte, na segunda edição. Nesta segunda vez eu já mandei o livro Água de Cacimba e camisinhas divulgando o próximo lançamento: Fragmento Essencial. Mandei 300 preservativos dentro de uma caixa grande decorada com a capa do livro. Só não fui entrevistado porque foi na fase em que Jô estava trocando o SBT pela Globo e sua prpodução não estava mais agendando ninguém. No meu site (http://www.jcramos.com.br/) esses dois programas estão disponíveis para quem quiser assistir.

ZONA SUL – Ter seu trabalho divulgado no programa de Jô Soares deve ter causado ótima repercussão.
JC RAMOS - As pessoas são muito vaidosas, só valorizam a coisa quando vêem na televisão ou no jornal. Se não sair, não existe. Você pode ter uma idéia sensacional, mas se não conseguir colocar na mídia, essa idéia não tem valor nenhum para certos tipos de pessoas. Foi muito interessante o apoio do Jô, porque ele ficou falando no assunto durante quatro minutos. O mais interessante é que, depois disso, todas as pessoas que eu encontrava diziam que tinham me visto no Jô Soares. Eles me viram lá! “Ah, você foi entrevistado pelo Jô, eu vi você”. E eu não podia dizer que não. Afinal de contas eu estava lá através do meu trabalho.

ZONA SUL – E a repercussão sobre a qualidade dos poemas, como foi?
JC RAMOS – Enorme. Para o lançamento do livro eu tinha convidado desde os garis até o prefeito da cidade. Muitas pessoas nunca tinham ido a um evento desse tipo. E levaram uma boa impressão. Depois do lançamento, fui convidado para ser membro da Academia Itajaiense de Letras. O presidente de lá me falou que depois que eu lancei Água de Cacimba a produção de livros em Itajaí dobrou. As pessoas começaram a me utilizar como exemplo. Se eu tinha conseguido realizar o meu sonho, por que elas não conseguiriam? Muitas retiraram seus escritos das gavetas e foram à luta. Teve um juiz que, na fila de autógrafos, pediu para eu dedicar meu livro à filha dele, “para ela aprender a sonhar como você”, ele comentou. A segunda edição eu lancei na Academia Maranhense de Letras, com as presenças de José Sarney, Roseana Sarney e do ex-presidente da Academia Brasileira de Letras, Josué Montello.

ZONA SUL – Na divulgação do segundo livro você utilizou também a camisinha...
JC RAMOS – A coisa foi um pouco diferente. O livro Fragmento Essencial não foi um livro divulgado em preservativo. Foi o primeiro livro lançado em embalagens de preservativo. Primeiro nasceram os textos, depois o livro. Os textos saíram dos preservativos para o livro.
ZONA SUL – Depois do sucesso do primeiro livro, o contato com a Olla deve ter ficado bem mais fácil.
JC RAMOS – Não tenha dúvida. Tanto é que hoje são mais de 100 mil preservativos que a Olla já disponibilizou para mim. Tenho uma cota anual, a não ser que tenha algo extra, de 60 grosas (8.640) de preservativos. Quando existe um congresso ou algum evento especial, faço uma solicitação extra. Antes a Olla mandava a embalagem para mim e eu colava o adesivo, a etiqueta. A partir desse ano a Olla não fabrica mais a embalagem de papelão por fora do preservativo. Mas para não me deixar numa situação difícil, a empresa concordou que eu imprimisse as embalagens de papelão. Mandei dois modelos, eles aprovaram um, consegui com a minha editora, a Litteris, e com a Unigraf, a impressão de 10 mil caixinhas.

ZONA SUL – Esse novo lote de caixinhas foi o que serviu para a estréia propriamente dita da camisinha poética?
JC RAMOS – Sim. Fiz oito poemas, todos traduzidos também para o espanhol, com objetivo de atender aos turistas que freqüentam Itajaí. A Secretaria Municipal de Saúde, com o apoio do Ministério da Saúde, viabilizou 50 mil camisinhas poéticas agora para esse último carnaval para serem distribuídas junto com os preservativos do governo federal. Atualmente, qualquer preservativo comprado pela prefeitura de Itajaí é distribuído dentro da embalagem com minha poesia. Estou conversando com pessoas ligadas à área de saúde do Ceará e do Maranhão para viabilizar a camisinha poética nesses dois estados. Mas meu grande sonho é publicar esse meu segundo livro e as camisinhas poéticas em inglês, francês e espanhol para que eu possa lançá-los nos países africanos. Eles precisam muito.

ZONA SUL –Como surgiu a idéia de, ao invés da propaganda, colocar os fragmentos das poesias em embalagens de preservativo?
JC RAMOS – As pessoas começaram a me cobrar, inclusive professores e a coordenadora do programa municipal DST/Aids de Itajaí, Rosálie Knoll, um livro mais voltado para a questão da prevenção. Então resolvi escrever textos mais voltados para a prevenção, mas sem esquecer o lado romântico da coisa. Você encontra fragmentos mais contundentes e outros que enfocam a questão da prevenção e da qualidade de vida de maneira mais romântica, mais suave, mais cor-de-rosa, até porque o livro não é técnico.

ZONA SUL – Quando o livro foi lançado?
JC RAMOS – A primeira edição é de 2004. Contei com o apoio da Lei do Incentivo à Cultura do município de Itajaí. O lançamento teve uma cobertura grande dos meios de comunicação, sem falar que foi o primeiro livro lançado no recém inaugurado teatro municipal de Itajaí. Em seguida fui convidado pelo então presidente do Congresso, José Sarney, através também do senador Lenoel Pavan, para lançar na Biblioteca do Senado, em dezembro de 2004. Depois o governo do Maranhão promoveu um lançamento no centro histórico. É bom destacar que a apresentação de Fragmento essencial foi escrita pelo então ministro da Saúde, José Serra.

ZONA SUL – O que você está planejando em seguida?
JC RAMOS – Estou escrevendo um romance bem diferente. Gosto de fazer coisas diferentes. Pelo menos na minha cabeça é diferente. É um resgate de uma infância, uma ficção. Terá também uma grande sacada ecológica. É o que posso antecipar sobre o próximo livro. Enquanto o romance não chega, continuo sonhando em lançar Fragmento Essencial na África.

ZONA SUL – Mande um recado para Natal.
JC RAMOS – Num futuro muito próximo gostaria de fazer um grande lançamento em Natal, até porque eu tenho uma curiosidade imensa de conhecer a cidade. Estou à disposição de quem quiser viabilizar esse desejo junto comigo. Basta entrar em contato através do telefone (47)9983-5888, ou entrar no site http://www.jcramos.com.br/ Pra mim será uma satisfação imensa.